Psicologia Transpessoal
Escrito por Érika SilveiraCompreender a mente humana sempre foi um dos maiores desafios para a Ciência, e a psicologia nasceu com esse objetivo, o de estudar os fenômenos psíquicos e do comportamento de um indivíduo ou grupo. O termo psique, no dicionário, tem o significado de alma, espírito e mente, mas muitas correntes psicológicas ainda não abordam a dimensão relativa ao espírito por associarem o termo alma a religião.
Por outro lado, grandes avanços estão ocorrendo nesse campo. Dentre os estudos que levam em conta o transcendental, está a psicologia transpessoal, que tem contribuído muito para a análise integral do indivíduo. Mesmo com tantos pontos positivos e já sendo reconhecida na Europa e EUA há mais de quarenta anos como uma ciência, ainda não foi aprovada no Brasil pelo CRP (Conselho Regional de Psicologia).
Antes de abordarmos especificamente a psicologia transpessoal como tema principal, é importante termos uma pequena noção sobre as áreas da psicologia em geral.
A psicologia, no Ocidente, teve sua origem na Grécia, por volta do ano 500 a. C, mas ainda inserida na filosofia. Grandes filósofos se destacaram e contribuíram para a criação da base da filosofia ocidental, dentre eles, Aristóteles, Sócrates e Platão. A psicologia demorou a ser reconhecida separadamente e como uma ciência. Isso só ocorreu no final do século XIX. Com o tempo, foram sendo criadas diferentes correntes, escolas e metodologias, que apresentam, até hoje, divergências entre si.
Para compreendermos as diferenças de cada uma delas e os benefícios da psicologia transpessoal no tratamento terapêutico, entrevistamos Maria Del Mar Franco, psicóloga, apresentadora do programa Evoluir, na Rede Boa Nova de Rádio e diretora do Instituto de Psicologia Evoluir, no bairro do Tatuapé, em São Paulo.
Mais do que uma simples entrevista, Del Mar passou, em três horas de conversa, muitas informações importantes e esclarecedoras que esperamos poder transmitir ao leitor.
As quatro abordagens
Embora existam diversas áreas dentro da psicologia e muitas linhas diferentes de atuação dos terapeutas, essa ciência foi dividida em quatro grandes abordagens.
Psicologia Comportamental: Criada por John B. Watson na primeira metade do século XX, foi a primeira abordagem a fundamentar a psicologia como ciência. Seus estudos passaram a associar o comportamento dos animais em laboratório ao dos seres humanos. Seus fundamentos são baseados nos estímulos e respostas, mas sem necessidade de interpretação. Para Watson, tudo o que não pudesse ser observado em laboratório não tinha valor científico.
Com o tempo, a psicologia comportamental foi revendo alguns conceitos e evoluiu. Na década de cinqüenta, surge a psicologia comportamental cognitiva, com Aaron Beck. O processo deixou de ser analisado apenas por estímulo e resposta, e o foco passou a ser a compreensão por aspectos mais complexos que apenas os comportamentais, sempre utilizando a metodologia científica positivista da época.
Psicanálise: Abordagem criada por Sigmund Freud, produziu novas teorias sobre os comportamentos e algumas patologias que não se resolviam pela medicina tradicional. Com a psicanálise, alguns termos técnicos se popularizaram, tais como: inconsciente, id, ego, super ego, libido e complexo de Édipo. Vale lembrar que muitas outras escolas se desenvolveram a partir da psicanálise. Jung foi um dos principais discípulos de Freud. Ele foi muito além de seu mestre e abordou questões ligadas ao transcendente. Essa abordagem desenvolvida por Jung recebeu o nome de psicologia analítica, traduzindo uma nova visão do ser humano. Com isso, passou a levar em conta a totalidade do indivíduo. Utilizou termos como: inconsciente coletivo, arquétipos, sombra (parte escura da alma, característica rejeitada ou esquecida no inconsciente); sincronicidade e Self (totalidade psíquica), que para os espíritas significa espírito, encontro com a essência. Dizia que a terapia era uma comunhão de almas; valorizou as religiões, as mitologias e os símbolos como fonte de conhecimento da psique.
Psicologia Humanista: Enfoca o estudo da consciência e o reconhecimento dos significados das dimensões espirituais da psique. Tem como objeto de estudo os estados de consciência que transcendem o conceito de ego. É a escola da psicologia que pesquisa a espiritualidade. Surgiu na década de 1950, nos EUA e na Europa, como uma reação às limitações da psicologia comportamental. A abordagem humanista passou a dar maior importância as emoções e a buscar o desenvolvimento dos potenciais humanos. Os representantes pioneiros foram Carl Rogers, que falava da intuição e Abraham Maslow, que já previa a chegada de uma psicologia da quarta força, uma psicologia que iria além de tudo que se tinha estudado até então. A visão do ser humano, na psicologia humanista, é a de um ser criativo, com capacidades de auto-reflexão, decisões, escolhas e valores. A respeito da psicanálise, Maslow afirmava que Freud havia se detido apenas na doença e na miséria humana e que era necessário considerar os aspectos saudáveis, encontrando assim, um sentido maior na vida. Também já falava da importância de se vivenciar o aspecto transcendental da vida.
Psicologia Transpessoal: A partir das idéias do transcendente abordadas por Jung e do humanismo defendido por Maslow, nasceu a psicologia transpessoal. Uma nova abordagem que vai além da matéria. Uma ciência holística que busca entender o ser humano em sua totalidade. É uma ciência baseada na física quântica, que poderá construir uma ponte entre a ciência e o mundo espiritual. A psicologia transpessoal leva em conta o registro dos sistemas energéticos do cosmo por outro tipo de sensibilidade, algo que os cinco sentidos (paladar, olfato, tato, visão e audição) não são capazes de identificar. Se a vida começa antes do berço e continua após o túmulo, existem outros aspectos que precisam ser analisados. A transpessoalidade abre esse canal de intercâmbio entre o visível e o invisível, dentro dos estudos da psique.
A descoberta da quarta força
A psicologia transpessoal é considerada a quarta força da psicologia, uma abordagem que permite transcender todos os conceitos estudados e aceitos pela psicologia tradicional até o momento. A postura da transpessoal é a de compreender o ser humano integrado com o Todo, estabelecendo uma inter-relação de todos os sistemas existentes no Universo.
A psicologia transpessoal possui muitos colaboradores e precursores. O primeiro grande colaborador foi Jung, que nas teorias da psicologia analítica avançou ao considerar a dimensão espiritual; aproximou-se das filosofias e religiões e introduziu uma nova forma de praticar a psicologia clínica.
Em seguida, veio a colaboração de Maslow com a psicologia humanista, que enfatizou a necessidade de ir além do estímulo/resposta do comportamentalismo e da psicanálise de Freud. Maslow já dizia que chegaria uma quarta força na psicologia, que levaria em conta todos os aspectos ignorados.
Mas foi em meados da década 1960 que o psiquiatra Stanislav Grof cunhou o termo psicologia transpessoal e falou dos estados ampliados de consciência. Nasceu assim uma nova e revolucionária visão da mente. Desde então, tem ajudado muitas pessoas a compreenderem as problemáticas da alma não analisadas por outras correntes psicológicas. Em 1956, iniciou uma pesquisa no Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Praga, onde trabalhava, e depois, em 1967, em um instituto dos Estados Unidos. A pedido de um laboratório da Suíça testou a substância alucinógena LSD em voluntários, com o intuito de descobrir o potencial que a droga oferecia no tratamento de distúrbios psíquicos. Chegou à conclusão de que a droga não induzia a formas específicas de alucinação que se esperava. Quando o LSD passou a sofrer restrições legais, deixou de utilizá-lo em suas experiências. Algum tempo depois, desenvolveu uma nova técnica para a ampliação da consciência, chamada de respiração holotrópica, que consiste, além de uma forma específica de respiração, na audição de músicas com poder evocativo e movimentos corporais localizados. Stanislav Grof também fundou a Associação Transpessoal Internacional, com o objetivo de promover o diálogo entre cientistas e líderes espirituais, para que cada qual pudesse contribuir com elementos de conhecimento na compreensão do ser humano.
Outro grande colaborador foi Roberto Assagioli, que criou o processo da psicossíntese (tipo de resposta ao método fragmentar da psicanálise, deixando clara a responsabilidade do indivíduo no processo do próprio crescimento).
A proposta da psicologia transpessoal é enxergar o homem não como simples máquina biológica, mas como um espírito imortal, capaz de armazenar em seu perispírito traumas e dramas esquecidos no inconsciente, mas que se refletem em sua vida atual, podendo afetar o organismo e a psique de diversas formas. Mas, segundo a psicóloga Del Mar, é preciso que se tome cuidado para não se levar tudo para o enfoque do transcendente, porque existem coisas que são materiais e se manifestam no psiquismo. "Não existe mágica; a psicologia transpessoal não é capaz de curar todos os problemas", ressaltou.
Muitas são as técnicas utilizadas pelos terapeutas nessa abordagem. As mais conhecidas são a regressão de memória, o renascimento e a respiração holotrópica. De acordo com a psicóloga, independente da técnica usada, a interiorização do paciente permite grandes percepções, e a abordagem integral dá espaço para o campo espiritual. Isso quer dizer que a psicologia transpessoal vê a expansão da consciência como algo muito saudável e não como fator patológico.
A solução das problemáticas reside na integração do ser humano com ele mesmo, com o outro, com a natureza e finalmente, com o Universo. "Devemos trabalhar em conjunto com as questões físicas, emocionais, mentais e espirituais, quatro pontos importantes que levam a compreensão do todo", refletiu.
Mesmo com tantos benefícios que a psicologia transpessoal pode trazer para as pessoas, talvez o que dificulte sua aceitação no Brasil é a distorção de sua aplicação com a mistura de certos rituais, e também, a falta de material didático publicado.
União psicológica e espiritual
Quando Jesus disse: "Vós sois deuses", já convidava a humanidade para o despertar do potencial que existe em cada um de nós. O ser humano desconhece a força que reside dentro dele, sendo imagem e semelhança do Pai.
A união da psicologia no estudo da mente e do comportamento do indivíduo ou grupo com a compreensão do espírito que comanda a psique, será a chave para a busca do autoconhecimento. "Conhecereis a verdade e ela vos libertará", afirmou o Mestre da Galiléia.
O universo está em constante evolução e chegará um dia em que o meio científico não poderá mais fugir da realidade do espírito, pois sem a aceitação da alma como essência de tudo, não encontrará mais respostas para tantos questionamentos.
Dentro da literatura espírita, uma série de doze obras ditadas pelo espírito Joanna de Ângelis, psicografadas pelo médium Divaldo Pereira Franco, abordam com muita propriedade temas ligados a psicologia. A autora utiliza os aspectos positivos de cada uma das abordagens, à luz do espiritismo e dos ensinamentos de Jesus para uma profunda reflexão. Segundo Joanna de Ângelis, o espírito é a base da psicologia transpessoal. Os livros: Jesus e Atualidade, O Homem Integral, Plenitude, Momentos de Saúde, O Ser Consciente, Autodescobrimento -Uma Busca Interior, Desperte e seja Feliz, Vida: Desafios e Soluções, Amor Imbatível Amor, O Despertar do Espírito, Jesus e o Evangelho - À Luz da Psicologia Profunda e Triunfo Pessoal compõem a série.
O espiritismo pode contribuir para preencher lacunas ainda existentes na Ciência. Fatos inexplicáveis para o materialismo são explicados com riqueza de relatos pela doutrina espírita. Para a psicóloga Del Mar Franco, cada abordagem psicológica é destinada a um gênero de problema e é também preciso que a pessoa observe se está alcançando evolução dentro da terapia, caso contrário, a mudança é necessária. "A psicologia transpessoal é indicada para as pessoas que buscam explicações e soluções para questões ligadas ao campo emocional e espiritual", concluiu.
Este artigo foi publicado na Revista Cristã de Espiritismo, edição 36. Ao usar o texto, favor citar o autor e a fonte.